Quem é vivo sempre aparece

Um dos conceitos mais básicos do automobilismo sempre foi: “Pneu é tudo”. Claro que um carro de corrida também depende de uma série de outros fatores para atingir o desempenho ideal, mas que pneu sempre foi “o cara” do automobilismo, ah foi!

Pois a Fórmula 1 se preocupou tanto nas últimas duas décadas com a evolução aerodinâmica, que a importância dos pneus parecia, há um bom tempo, que havia perdido o posto de ator principal neste circo da velocidade. Eis que, após tantos anos, ele resolve voltar para ocupar o lugar de maior destaque, que sempre fora seu.

Após três provas, ficou claro o quanto o retorno de pneus mais macios e pouco duráveis fez bem a F1. Com exceção da primeira corrida, em Melbourne, onde a Pirelli levou compostos mais resistentes, a corrida da Malásia e, principalmente, a da China deste domingo demonstrou que, finalmente, aqueles que comandam a F1 acertaram em alguma coisa nos últimos tempos.

Vários sinais apontam que esse novo conceito de durabilidade para os pneus pode render ao mundo da Fórmula 1 o retorno de fortes emoções. O maior exemplo talvez seja exatamente a manobra da vitória de Lewis Hamilton neste domingo.

O inglês, com pneus mais novos, “voou baixo” nas últimas 15 voltas da corrida. Sobrava tanto na pista em relação ao até então imbatível Sebastian Vettel, que ignorou a reta oposta, a ridícula “asa móvel” e o Kers. Ultrapassou o atual campeão do mundo sem cerimônias, em um ponto do circuito que, até o ano passado, seria um mero delírio imaginar que entre dois carros competitivos pudesse ocorrer uma troca de posições ali em condições normais e  ainda nas últimas voltas da corrida.

Responsabilidade apenas da estratégia? Não. A tática de cada equipe será muito importante daqui em diante, assim como foi fundamental ontem para derrubar os pilotos da Ferrari e para elevar os da McLaren, mas a mão do piloto também terá sempre um papel fundamental a partir de agora. Webber provou isso. 

Simplesmente foi perfeito. Conseguiu ser rápido, realizar diversas ultrapassagens e provavelmente passaria Vettel se ainda restasse um pouquinho mais de voltas.

Nem me lembro da última vez que havia assistido ultrapassagens por fora na F1. Pois vi na Malásia e novamente na China. Fechei os olhos e me lembrei fielmente dos anos de 1980 e 90, quando ficava com meu pai fazendo contas para tentar prever se o piloto que vinha atrás com pneus menos gastos conseguiria ou não se aproximar do ponteiro e lutar pela vitória. Eu vi, juro que vi, um pouco daquela antiga Fórmula 1 neste domingo.

No dia 08 de maio, os pilotos irão enfrentar o fantástico circuito de Istambul. Por suas peculiaridades, provavelmente a pista turca exigirá ainda mais dos pneus, até porque seu asfalto é uma verdadeira lixa.

Por fim, me recuso, mais uma vez, e para sempre, a aceitar essa estúpida “asa móvel” e o seu sistema de uso. 

Primeiro, porque a regra de utilização é esdrúxula, injusta e sobretudo antidesportiva. Segundo, porque as ultrapassagens, através do seu uso, simplesmente têm sido burlescas, sem disputa, sem emoção.

Por isso, o meu agradecimento por esta bela corrida ficará novamente restrito aos pneus, ou melhor, ao desgaste deles. 

E desejo, com muito carinho, que se acabem cada vez mais.

Até a Turquia!

Pneus calibrados de esperança

Após um bom tempo, vi algo diferente e animador na Fórmula 1. E já adianto. Não se trata das ultrapassagens facilitadas pela “asa móvel” e pelo Kers, porque, apesar de assistir ultrapassagens nítidas sob a influência desses dispositivos, não engoli nem um dos dois ainda.

Confesso que não consigo entender a “asa móvel”. Pra mim, repito o que disse no post anterior: a lógica desse sistema é a mesma que obrigar um piloto a diminuir a velocidade do carro na reta dos boxes, a partir do momento que houver alguém atrás e a menos de um segundo de diferença dele.  Se alguém quiser me explicar porque não seria a mesma coisa, agradeço.

O que me encheu os olhos nessa corrida, de verdade, foram as disputas oriundas das variações de desempenho frente ao desgaste dos pneus dos carros. Isso, sim, propicia uma disputa justa. A badalação em torno da “asa móvel” e do retorno do Kers é tão grande, que estão atribuindo a maioria das ultrapassagens ao uso desses dispositivos e estão se esquecendo de analisar o quanto os pneus foram responsáveis pelas mudanças de posição em Sepang.

A ultrapassagem mais bonita do Grande Prêmio da Malásia foi, sem dúvida, a de Mark Webber sobre Felipe Massa. Busque na internet, reveja, observe atentamente a manobra do australiano. Neste caso, não houve interferência alguma da asa aberta. Webber freia ainda com o seu carro atrás do de Massa, mergulha por fora na curva 1, contorna, mantendo-se por fora o tempo todo e, por contar com pneus melhores naquele instante, consegue chegar à curva 2 à frente de Felipe. Uma belíssima ultrapassagem, com sabor nostálgico.

Quer mais um exemplo? Fernando Alonso, mesmo sem conseguir abrir a asa a partir da metade da corrida (quero ver o dia em que ela começar a não fechar), diante do mau rendimento dos pneus de Hamilton, se aproximou do maior rival, proporcionou a todos uma belíssima disputa e, quando parecia que faria uma linda ultrapassagem, errou ao tocar o bico do seu carro na roda traseira direita da McLaren do inglês. Mas o resumo da história é o mesmo: os pneus fizeram a diferença, não a asa.

Portanto, uma boa análise desses fatos por parte dos dirigentes da F1 poderia fazer, quem sabe, com que eles chegassem à conclusão de que deveriam reduzir a dependência dos carros da pressão aerodinâmica e resgatar o efeito solo. Com certeza, mudaria bem a cara da Fórmula 1 atual. E para melhor.

A corrida

Vettel mais uma vez venceu com propriedade. A sobra do alemão dessa vez não chegou a ficar em migalhas, mas também não foi um boi inteiro como na Austrália. Button, que chegou a menos de quatro segundos do vencedor da prova, esteve bem mais atrás até a metade da corrida, e talvez até sonhasse com uma vitória caso já tivesse largado atrás do atual campeão do mundo.

Surpresa, que parece não ser mais um termo adequado para este caso, foi novamente o bom desempenho das Renaults. Dessa vez, foi Heidfeld quem brilhou. Após uma largada surpreendente junto com seu companheiro Petrov, o alemão andou muito bem, cuidou perfeitamente dos pneus e foi ousado quando necessário.

A Ferrari poderia ter saído com um resultado bem melhor, mas errou no primeiro pit stop de Massa e viu Alonso também errar feio ao tentar ultrapassar Hamilton. Acredito que a Ferrari até evolua um pouco mais nas próximas corridas, mas acho difícil andar mais que a Mclaren na temporada e quase impossível render mais que a Red Bull.

Brasileiros

Felipe Massa, apesar de sofrer com mais um erro da sua equipe, fez uma excelente corrida. E o melhor disso? Talvez esteja adaptando-se melhor aos pneus, quem sabe achou a motivação e coragem que parecia ter perdido, guiçá fora apenas um lampejo. Mas, com certeza, provou que a maior bobagem que se pode dizer sobre ele é que o seu acidente em 2009 deixou-o com sequelas que minaram sua capacidade de ser competitivo.

Já Barrichello, se já não bastasse um pneu furado logo no início da corrida, sofreu mais uma vez com um carro que, ao que tudo indica, lhe trará mais dores de cabeça do que qualquer esperança.

Será que na China a Williams finalmente abrirá os olhos? 

Quem novamente madrugar verá.

Pré-Sepang e palpitecos

É agora! Chegou a sua vez. Faça com que os carros voem. A nossa esperança está depositada em você. Mostre ao mundo a que veio.

Devem ser mais ou menos essas as fiéis palavras que proferirá Bernie Ecclestone à tal “Asa Móvel” neste fim de semana. Mesmo porque se a abertura da asa traseira não adiantar nada em Sepang, correremos sérios riscos do chefão da Fórmula 1 realmente levar a sério a esquizofrênica ideia da chuva artificial.

O Circuito de Sepang é um dos mais belos e interessantes do calendário atual da F1. Seu traçado mescla curvas de baixa, média e alta velocidade, além de duas enormes retas, ambas com freadas fortes no final, o que possibilita boas chances de ultrapassagens.

A reta dos boxes é precedida pela oposta, que tem praticamente a mesma extensão da principal. A FIA ainda não anunciou se a abertura da “Asa Móvel” será permitida nas duas retas ou apenas na dos boxes. De qualquer forma, talvez tenhamos uma noção exata da sua eficiência por lá. Até acredito que nesta corrida da Malásia a coisa funcione, e até com risco de assistirmos uma banalização nas ultrapassagens, mas não me animo muito com o que virá pela frente.

Agora, vamos imaginar que esse sistema realmente funcione nessa pista. Peço, por favor, que me ajudem, pois é demais para uma pessoa só tentar assimilar que a abertura da asa pode ser realizada pelo piloto que está atrás e não pelo da frente. Ajude-me a pensar. Isso não seria o mesmo que obrigar o piloto da frente a aliviar o pé ou diminuir a potência do seu motor sempre que houver alguém a menos de um segundo dele? Responda-me ou apenas reflita.  Conceitualmente, qual é a diferença?

Bom... Vamos deixar essa conversa para depois da corrida. É mais prudente. Até porque o Grande Prêmio da Malásia acontece sempre com a expectativa de muita chuva. E, caso ela resolva realmente aparecer, a “Asa Móvel” provavelmente não será nem mesmo uma coadjuvante neste domingo.

Palpitecos

As equipes nanicas continuarão bem baixinhas.

Confesso que não tenho uma opinião formada sobre a Sauber, mas estou curioso para saber se surpreenderá novamente.

Dificilmente um piloto da Renault brilhará tanto novamente em Sepang.

Não creio em uma evolução fantástica da Ferrari, como não creio em nenhuma melhora significativa da Mercedes, mas acredito em uma boa prova do Barrichello.

A Red Bull continuará sendo “A Equipe”, mas talvez com uma diferença bem menor entre Vettel e Webber.

E, por fim, me arrisco a dizer que a McLaren dará muita dor de cabeça a eles nesse fim de semana. E, para não pipocar, acho que “O Piloto” desse fim de semana se chama Lewis Hamilton.

É madrugar para ver.

A RED BULL NÃO LHE DARÁ ASAS

Desde os treinos livres do primeiro Grande Prêmio do ano, já era possível antecipar o quão Sebastinan Vettel seria mais rápido em relação aos demais. Salvo o talento do jovem alemão, em diversos momentos dos treinos ficava escancarada a superioridade do carro do número 1 da Red Bull.  

Vettel estava em um patamar tão superior que, em determinado momento do último treino, antes do classificatório, conseguiu ser o mais rápido, mesmo utilizando pneus duros, enquanto seus oponentes já “calçavam” os macios. O acerto do carro do atual campeão do mundo dava a impressão de uma aderência sublime, que ficava evidente, sobretudo, na penúltima curva do circuito australiano.

Na vida, geralmente, quanto mais você conhece sobre um assunto, menos se surpreende com algo relacionado a ele. Pois a classificação do GP da Austrália tratou de atestar que isso pode até ser verdade, mas jamais será uma regra. A diferença absurda de tempo entre Vettel e os demais pilotos, com certeza, assombrou mais aqueles que conhecem do assunto do que um mero torcedor casual.

Na corrida, tudo se confirmou. A primeira volta de Vettel já foi o prenúncio de quem seria o dono absoluto da prova. E após 58 voltas, 22 segundos separaram o vencedor do segundo colocado e apenas cinco pilotos não receberam de presente uma volta do alemão. 

Vettel foi perfeito. Andou rápido quando necessário, controlou o desgaste dos pneus sem se preocupar com o retrovisor, não errou e venceu com a postura dos grandes campeões.

E para fechar a conta, o mais incrível talvez não fora a diferença do atual campeão para todos os outros pilotos, mas sim o enorme vão que o separou do seu companheiro de equipe. Sebastian é mais talentoso e rápido do que Mark Webber, mas não para isso tudo a bordo do mesmo carro.

O australiano, diante da sua torcida, desde o primeiro dia de treinos, em nenhum momento ensaiou qualquer possibilidade de vitória. Posso até estar enganado, mas o discurso da Red Bull de não ter primeiro piloto caiu após essa primeira corrida do ano. Até acredito que dentro das pistas a equipe não determinará a inversão de posições entre seus pilotos, mas que o carro do alemão será tratado com mais carinho do que o do australiano, eu não tenho dúvidas.

E se Webber, com o passar do tempo, começar a se perguntar por que não consegue chegar próximo dos tempos do companheiro, o título desse texto começará a fazer bastante sentido também para ele.

Novas regras, desprovidas mudanças
Pobres aqueles que acreditam que o retorno do kers e agora a tal da asa móvel irá aumentar o número de ultrapassagens. Impressionante como a própria Fórmula 1 não entende o seu real problema. E assim padece daquela máxima: “Quem não reconhece as próprias imperfeições jamais mudará”.

Há anos, os carros da F1 se tornaram dependentes ao extremo da pressão aerodinâmica. Desde o surgimento e aprimoramento dos túneis de vento, as equipes iniciaram um profundo estudo científico em busca do aproveitamento perfeito da passagem do ar pelos carros. Com o tempo, e após investirem bilhões nesses estudos, atingiram quase a perfeição.

Porém, toda essa eficiência aerodinâmica só funciona perfeitamente quando o piloto tem todo o ar disponível apenas para ele. Ao contrário, passa a ter um monstro nas mãos. Por mais aderentes que sejam os pneus de um carro da F1, e por mais bem acertado que esteja para uma pista, quando há, por algum instante, a perda parcial do ar, o carro se torna extremamente instável e perigoso.

Você percebeu quantas vezes durante a corrida deste domingo os pilotos que acionavam a asa móvel saiam da linha do carro à frente? E será por quê? Simples. Se na ausência de ar, há perda considerável de equilíbrio, o carro deve ficar muito mais instável quando o piloto, neste momento, diminui ainda mais o seu arrasto aerodinâmico. 

A asa móvel pode até ajudar em eventuais ultrapassagens, porém apenas quando envolver dois carros com desempenhos muito distintos e em pistas com retas muito longas. Entre dois carros semelhantes, é melhor esquecermos. A boa briga entre Massa e Button nas primeiras voltas da corrida comprova isso. Button era bem mais rápido. Acionava o dispositivo da asa móvel, mas Massa defendia a posição e nada acontecia. A briga seria idêntica sem esse sistema.

Já sobre o kers, penso que nem deveríamos perder muito tempo com isso. Para falar a verdade, nem mesmo o relançamento do fusca, na época do governo Itamar Franco, foi um feito tão ridículo. O kers não aumenta o número de ultrapassagens, pois o acionamento do sistema é feito de forma muito semelhante pelos pilotos; sempre na saída das curvas de baixa, na entrada das grandes retas e praticamente nos mesmos pontos da pista.

O GP da Austrália serviu para que apenas eu consolidasse a minha opinião. Para a F1 voltar a reviver constantes ultrapassagens é necessário, antes de tudo, criar condições para que os carros andem próximos e diminuir a eficiência dos freios. O problema é que muitos acreditam que mudanças nesse sentido seria o mesmo que abraçar o atraso. É a mesma posição, por exemplo, de quem acha que a solução talvez seja criar chuva artificial.

Há louco para todos os gostos.

LARGADA PARA UM NOVO DESAFIO

Escrever sobre Fórmula 1 é um desejo antigo meu. A ideia de contar um pouco daquilo que vejo, sinto e penso sobre a categoria dos carros mais rápidos do mundo é antiga, mas esperei um bom tempo para iniciar esse projeto.

Nunca desacreditei que seria capaz, mas antes procurei ver, ler, ouvir e compreender melhor alguns aspectos desse esporte. Para mim, as palavras são sagradas. Aquilo que escrevemos fica registrado para sempre. Por isso, segurei tanto esse plano.

O objetivo que tracei para esse blog é o de tentar fugir do óbvio, não colocar a passionalidade entre eu e o teclado, chegar o mais próximo possível da visão de cada piloto. 

O automobilismo é muito mais complexo do que a maioria das pessoas imagina. O desconhecimento técnico faz com que muitos distorçam fatos, crucifiquem pilotos e equipes porque deixam de fora da conta fatores importantíssimos.

A crítica é essencial no jornalismo, mas a condenação baseada na ignorância é lamentável. Trabalhar com versões ao invés de fatos é o ingrediente perfeito, porém venenoso e cruel nessa relação.

O meu desafio será oferecer ao leitor um texto leve e descontraído, mas com muita informação. Na verdade, será o de fazer o mais simples, que tanto hoje o jornalismo carece: contar uma boa história.

Espero que goste.